Corda da forca, pescoço do trabalhador

Uma entrevista com Nilmário Miranda, secretário do Direitos Humanos de Minas Gerais


Por Altino Filho

Até 1964, ano do golpe militar, Nilmário Miranda viveu em sua terra natal. Apesar de ter apenas dezessete anos, já completava dois de militância política em Teófilo Otoni. Foi naquele emblemático ano que deixou o Vale do Mucuri para estudar Economia em Belo Horizonte. E, por conta da militância, foi obrigado a largar o curso, em dezembro de 1968, após a decretação do famigerado Ato Institucional número 5 (AI-5) pelo governo militar. A partir daí, passou mais de três anos entre clandestinidade e prisões. Voltando à vida legal – ou a permitida na época – cursou jornalismo e fez mestrado em Ciência Política.

Se o início da atividade política se deu em 1962, sua primeira eleição só aconteceria 24 anos depois, em 1986. Foi deputado estadual, deputado federal por quatro vezes, candidato a governador e ministro dos Direitos Humanos. Nilmário Miranda também ocupou a presidência do PT-MG e da Fundação Perseu Abramo, onde ainda hoje é membro do Conselho.

Nilmário está de volta à área dos diretos humanos, no comando da Secretaria de Direitos Humanos, Participação Social e Cidadania (Sedpac), criada no governo Pimentel. Com a autonomia conquistada ao longo da vida, e prestes a completar setenta anos em agosto próximo, sente-se livre para externar o que pensa e decreta: “Eleições sem a candidatura de Lula não pacificarão o país”A seguir, a entrevista exclusiva de Nilmário Miranda para O Beltrano.

Em Minas Gerais, temos um governo de esquerda, mas com o desconfortável suporte do PMDB, no que se assemelha ao modelo de Dilma na Presidência e pelo qual foi traída. Como o senhor enxerga essa correlação de forças no governo Pimentel?

O PMDB ligado ao presidente da Assembleia Legislativa de Minas Gerais (Adalclever Lopes – PMDB*) é um aliado leal, identificado com o projeto de governo de Pimentel e se opõe às maquinações de Antônio Andrade (vice-governador, também do PMDB, que apoiou o tucano João Leite para a Prefeitura de BH). Na Assembleia, o governador teve, em média, o voto de 55 deputados estaduais (do total de 77 deputados) e não perdeu nenhuma votação.

O ressurgimento das direitas em várias partes do mundo, notadamente na Europa e ratificada nos Estados Unidos com a vitória de Donald Trump, acontece também no Brasil de hoje. Qual a leitura que o senhor faz deste processo social e político?

No Brasil, a extrema direita está organizada em torno de Jair Bolsonaro, que é intocável. Ela sempre existiu, mas agora se sente livre e protegida para pregar contra o sistema democrático, acirrar o ódio racial, de gênero, étnico, a LGBTfobia e até a xenofobia.

Como o senhor vê os desdobramentos da operação Lava Jato que mobiliza as ações do judiciário brasileiro?

Votei, como deputado federal, no Projeto de Lei que regulamentou a delação premiada e no que estabelece punição a empresas corruptoras. O problema não é o combate à corrupção. Essas leis nasceram no governo Dilma. O problema são os abusos de autoridade, os vazamentos ilegais e seletivos. É perigoso também que grupos do Judiciário, do Ministério Público Federal e da Polícia Federal se arroguem o poder de desfazer o sistema político-partidário do país.

Estamos assistindo a perda de vários direitos dos trabalhadores, como no já aprovado projeto de terceirização. O senhor vê isso como irreversível? E ainda: há algo de positivo na terceirização?

A terceirização estendida a todas as atividades, inclusive atividades-fim, precariza o trabalho, enfraquece os sindicatos, propicia o aumento da mais-valia absoluta e dá excessivo poder ao capital. Pior é a reforma trabalhista: vale o negociado sobre o legislado, quando há 13 milhões de desempregados. É a negociação entre a corda da forca e o pescoço do trabalhador.

Qual seria a melhor estratégia para salvaguardar o que já foi conquistado do ataque contra as garantias da Previdência e das leis trabalhistas?

O que está em jogo é o pacto político pela Democracia e o pacto social da Constituição Federal de 1988. São pilares desse pacto social o tripé da Seguridade Social -o direito universal à aposentadoria justa, a saúde como direitos de todos e dever do Estado e a assistência social cidadã para os vulneráveis-; o direito humano ao trabalho decente; a presunção da inocência e a soberania popular nos direitos políticos. “Todo poder emana do povo”,  estabelece a Constituição logo no Art.1°. O impeachment sem crime de responsabilidade foi uma violação dos direitos políticos da população.

Como o senhor entende o processo político do país que divide a opinião pública entre aqueles que pediam a saída da presidenta Dilma – e rechaçam a volta do ex-presidente Lula – e os que defendem a volta do PT à Presidência?

Entendo que é fundamental um pacto pela democracia que devolva ao povo o direito de decidir qual projeto de país quer e pelo respeito às regras do jogo.

No ano que vem teremos novas eleições. Qual prognóstico o senhor arriscaria para a Presidência da República e o Governo de Minas, partindo do cenário atual?

Eleições sem a candidatura de Lula não pacificarão o país, pelo contrário. Ele cresce nas pesquisas em todas as regiões, classes, níveis de escolaridade e tem uma larguíssima vantagem no Nordeste, mesmo sem poder se defender. Tirá-lo da disputa terá consequências imprevisíveis. Em Minas, Pimentel tem um projeto político, econômico, cultural e social para o Estado e vai disputar esse projeto em 2018 com razoáveis chances.

* Os parênteses são de O Beltrano